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Empreendedorismo social: atual configuração, perspectivas e desafios


No presente artigo, procuramos apresentar os principais elementos introdutórios ao tema empreendedorismo, tomando como exemplo a realidade brasileira. Partimos da constatação de que o empreendedorismo social emerge no cenário dos anos 1990, ante a crescente problematização social, a redução dos investimentos públicos no campo social, o crescimento das organizações do terceiro setor e da participação das empresas no investimento e nas ações sociais. Atualmente, o empreendedorismo social se apresenta como um conceito em desenvolvimento, mas com características teóricas, metodológicas e estratégicas próprias, sinalizando diferenças entre uma gestão social tradicional e uma empreendedora. É o que procuramos apresentar, mesmo que sinteticamente e de forma introdutória, a partir dos principais conceitos, nacionais e internacionais, e de um exemplo típico brasileiro e de impacto global: as sensíveis diferenças entre empreendedorismo social e outros conceitos, como responsabilidade social empresarial e empreendedorismo privado. Finalizando, apontamos algumas características de entendimento do empreendedorismo social no Brasil, bem como alguns elementos sobre os desafios e possibilidades dessa nova forma e paradigma de gestão social que se apresenta como emergente e de grande poder de transformação social no cenário de um Brasil paradoxal, com muitos problemas, mas repleto de possibilidades. 

Autor: Edson Marques Oliveira

Palavras-chave 
Empreendedorismo social. Gestão social. Terceiro setor

Texto completo: Clique aqui


"Quem se Importa?"

'Quem se Importa?' mostra pessoas que tentam mudar o mundo.

Documentário de Mara Mourão, filmado em sete países, retrata o trabalho de 18 empreendedores sociais



São Paulo - O bangladeshiano Muhammad Yunus, criador do primeiro banco comunitário do mundo; o peruano Joaquin Leguia, que procura destinar 1% da terra de seu país às crianças para o cultivo sustentável; o brasileiro Eugênio Scanavino, que levou um barco-hospital a navegar pelas águas da Amazônia paraense, atendendo a comunidades ribeirinhas. São estes alguns dos 18 empreendedores sociais retratados no documentário Quem se Importa?. Contando histórias de pessoas que desenvolveram projetos transformadores de realidades sociais no Brasil e no mundo, o filme aponta o sentido do empreendedorismo social, também chamado de setor cidadão ou setor social. Com locução de Rodrigo Santoro, o documentário é dirigido por Mara Mourão.

Mara dirigiu centenas de comerciais de televisão. Em 1998 fez Alo? e em 2002 dirigiu Avassaladoras, ambas comédias. Seu terceiro longa-metragem, o documentário Doutores da Alegria, de 2005, exibe o trabalho da organização de mesmo nome que tem buscado humanizar o sistema de saúde brasileiro, com palhaços que divertem e ajudam crianças em recuperação. O trabalho do Doutores da Alegria também compõe o painel do empreendedorismo social montado por Mara, em Quem se Importa?.

Com cenas gravadas em mais de sete países, o documentário difunde um movimento mundial de empreendedorismo social. O termo foi criado por Bill Drayton, entrevistado no filme. Ele, que diz desejar erradicar com todos os problemas sociais do mundo, é o fundador da Ashoka, uma organização sem fins lucrativos que auxilia empreendedores sociais em mais de 70 países. As pessoas entrevistadas no filme realizam trabalhos cujo objetivo é o bem-estar social, percebem problemas sociais, na maioria das vezes causados pela pobreza, e procuram soluções.

Confira entrevista com Mara Mourão

Quem é o empreendedor social?
O empreendedor social é aquele que tem as mesmas características de um empreendedor de negócios, só que aplicadas para o setor social. Enquanto o empreendedor de negócios visa ao lucro – geralmente este lucro é para um grupo pequeno de acionistas –, o empreendedor social visa o bem-estar social. E se ele visa ao lucro, sim, é para revertê-lo ao bem-estar social. Ele tem as mesmas características de liderança, visão, persistência. É um sonhador, mas é prático e consegue viabilizar e implementar o que deseja. No entanto, como Bill Drayton diz no filme, somente ter essas características não fazem de alguém um empreendedor social. O que o empreendedor social faz é ter a capacidade de saber o que a sociedade precisa em um determinado momento. E ele não descansa enquanto não conquistar seus objetivos. Esse é o verdadeiro empreendedor social.

O empreendedor seria aquele que desenvolve grandes projetos sociais e consegue provocar mudanças na sociedade?
Tem empreendedores de vários níveis. Se a pessoa faz um trabalho em grande escala e afeta milhões de vidas, ela é chamada de empreendedor social. Se faz em escala menor, é chamada de transformador ou agente de mudança. Tem vários nomes, mas acho uma bobagem, todos são nomes diferentes, para um espírito comum, o espírito de arregaçar as mangas e não se conformar com uma realidade que não deve existir.

Você é uma empreendedora social?
Tem gente dizendo que eu sou, mas acho que não. Sou uma cineasta que está causando impacto social com os filmes. Quem sabe se eu fizer mais filmes assim, já não possa ser chamada de empreendedora social. Mas, por enquanto, sou só uma cineasta causando impacto, aliás, não é nem isso: estou causando inspiração, porque os filmes não mudam o mundo, quem o muda são as pessoas que assistem aos filmes.

Quem se importa? pretende ser mais do que um filme? Ele é um movimento?
É um movimento de inspiração. Ele inspira as pessoas a tomarem consciência de seu poder de transformação. É plantar a semente do “eu também posso fazer”, principalmente nos jovens. Nas redes sociais, na internet já temos milhares de pessoas divulgando o filme e compartilhando e discutindo os ideais dele. E eu sinto que tem muita gente que se importa e que faz questão de passar essa mensagem do filme adiante.

No documentário, o apelo à conscientização dos jovens é constante. O jovem pode ser um transformador social?
O Bill Drayton acredita que se 3% das crianças nas escolas fossem transformadoras, mudávamos o sistema num instante. Como ele comenta no filme, os pais vão ficar preocupados se o filho estiver indo mal em matemática, mas será que eles notam se o filho está sendo um provocador de mudanças? Os pais estão preocupados em formar cidadãos proativos, pessoas que realmente lutam pelos direitos dos outros? Não, estão preocupados se o filho vai bem nas matérias. Queremos mostrar que empreendedorismo social é tão importante quanto a matemática. Já exibimos o filme em escolas. Somos parceiros do programa Cinema para Todos do governo do Rio de Janeiro, que o levará para muitas escolas de periferia no estado. E já estamos falando com fundações para tentar levá-lo para escolas públicas em todo o Brasil.

O que você pensa da crítica de que a existência de ONGs e do terceiro setor é uma forma de privatizar serviços que o Estado deveria garantir?
A princípio você pode pensar que o empreendedor social está aqui para tapar o buraco do que o governo não conseguiu fazer. Obviamente, em países mais ricos, como a Dinamarca e a Suíça, tem menos empreendedores sociais do que na Índia ou no Brasil. É óbvio que os países com mais questões sociais vão ter mais empreendedores sociais. Porém, nem sempre o governo pode fazer o que o empreendedores sociais fazem, e vice-versa, porque eles têm características diferentes. O governo vive de eleições, e o político eleito não pode errar, porque ele não tem o direito ao erro. Não tem esse luxo, porque o erro é considerado um escândalo e não reelege ninguém. Já no empreendedorismo social, o erro e a experimentação são permitidos. E o setor social é muito mais ágil e menos burocrático que o setor governamental. Tem coisa que não dá pra tornar política pública, tem coisa que precisa ser feita por ONG, assim como tem coisa que precisa ser feita pela iniciativa privada. E eu acho que o filme transmite a ideia de que casamento entre esses três setores pode dar certo. O empreendedorismo social vai dar certo quando ele estiver misturado em todos os setores da sociedade e quando as pessoas de todas as esferas começarem a agir.

O empreendedorismo social, então, não é característico só do terceiro setor?
Não, ele pode estar na iniciativa privada ou no governo. O empreendedor social é um cara que muda um padrão na sociedade, uma situação, mas não importa a esfera em que atua. A política é uma forma de transformação social, mas quando um político cria uma lei que muda a sociedade em algum aspecto, ele está fazendo tanta transformação social quanto um empreendedor social. Só são nomes diferentes. Esse espírito do setor cidadão atuante deve permear toda a sociedade e todos os setores dela. O setor social cresceu muito nas duas últimas três décadas, por várias razões. Primeiro, porque mais de 200 países passaram a ter sistemas democráticos, e antes eram sistemas ditatoriais, absolutistas e  de apartheid. Depois, houve um aumento da classe média. E houve o advento da internet. Isso tudo fez com que o setor cidadão tivesse esse boom. Mas creio que no futuro não vai ter essa divisão de quem é empreendedor social e quem é cidadão. Todos seremos cidadãos mais ativos. É esse momento que Bill Drayton chama de combinação da democracia: quando todos os cidadãos são ativos.

Quem se Importa? retrata o trabalho de 18 empreendedores sociais de vários lugares do mundo. Como você chegou a esses nomes?
Com esse painel de empreendedores do arredor do mundo, com empreendedores de diversos países, quis mostrar que é um movimento mundial. Escolhi esses 18 nomes, depois de uma pesquisa extensa, na qual eu fui buscando pessoas de continentes diferentes e de áreas de atuação diferentes, que soubessem se comunicar bem e cujos trabalhos teriam imagens às quais eu teria acesso. Foi com muita dor no coração, porque deixei milhares de pessoas que eu conheço e que eu não conheço. Não caberia mais do que isso. É por isso que estou pensando em fazer uma série de televisão, para justamente apresentar as várias pessoas que tem trabalhos muito bacanas. Busquei em livros, internet e na rede Ashoka, um grande celeiro de empreendedores sociais. Cheguei a 50 nomes e fui afunilando até chegar nesses 18. Eu tentei buscar uma diversidade para justamente mostrar a riqueza do empreendedorismo social. Com o filme, você passa a entender que eles podem estar na área da educação, da saúde, do meio ambiente, dos direitos humanos, da economia, em qualquer área. O filme passa a mensagem de que todo mundo pode mudar o mundo não importa em que setor. Seja ele privado, governamental ou social. Qualquer pessoa pode fazer a diferença.

Você dirigiu comerciais para televisão antes de dirigir as comédias Alô? Avassaladoras. Como mudou para as temáticas sociais?
É fácil de entender. Eu já conhecia o trabalho do Doutores da Alegria porque o fundador, Wellington Nogueira, é meu marido. Eu sempre achei que daria um filme, mas o próprio trabalho ainda estava em crescimento, ainda estava em formatação. Mas quando acabei de fazer Avassaladoras, o Doutores da Alegria já estava solidificado, já tinha livros escritos, teses defendidas, centro de estudos, já estava um projeto absolutamente solidificado. Percebi que havia chegado a hora de mostrar para o público o que acontece dentro dos hospitais e que as pessoas não conseguem ver. E a resposta ao filme foi completamente diferente do que eu tinha com as minhas comédias, porque com elas era muito bacana, mas ficava naquela história de “eu ri muito e me diverti muito”, mas com o Doutores da Alegria, as pessoas me diziam que o filme havia mudado a vida delas. Fiquei chocada com o impacto do filme. Teve professores que mudaram o jeito de ensinar e jovens que mudaram o rumo de suas carreiras. Resolvi fazer um filme na mesma linha que o Doutores da Alegria, só que mais abrangente. Fiquei muito tocada com a reação do público e com o impacto que um filme pode causar. 

Mas há uma diferença entre fazer filmes de entretenimento e documentários?
A diferença é entre ficção e documentário. A ficção é mais simples. De um certo modo, você segue um roteiro, e na hora da edição, é muito mais simples, pois edita aquele o roteiro. Num documentário você tem um roteiro e depois você o refaz na edição. Fiquei um ano editando o Quem se Importa? porque havia milhões de possibilidades, com o material todo que tinha nas mãos. Mas tudo é cinema, tudo é audiovisual. Gosto de fazer os dois e vou continuar a fazer os dois. O que você não vai me ver fazendo é um filme que só tenha tiros e nenhuma mensagem. Minha ideia é fazer ficção que tenha alguma mensagem e documentário que tenha impacto social.

Em Quem se Importa?, Wellington Nogueira, entrevistado, comenta que, quando começou o trabalho do Doutores da Alegria percebeu o poder social que a arte pode ter. Você teve uma percepção semelhante?
Total. O impacto social que um filme pode causar não passa pela bilheteria. É uma outra métrica que se usa, e é uma métrica invisível mesmo, é a frase de Albert Einstein: “Nem tudo o que conta pode ser contado, e nem tudo que pode ser contado conta”. Você começa um filme e começa a influenciar e a inspirar a própria equipe que fez o filme, e vai como uma onda. O filme Uma Verdade Inconveniente,  do Al Gore, por exemplo, levantou a questão climática, e me lembro que via muitas pessoas discutindo a questão mesmo antes de terem visto o filme. O documentário Super Size, do Morgan Spurlock, também teve uma bilheteria pequena e acabou mudando o cardápio do McDonald's. O impacto social do cinema é muito forte. Gosto muito disso e vou usar o cinema como uma arte que impacta as pessoas para uma mudança positiva. 

Quem se importa? 
Direção: Mara Mourão
Locução: Rodrigo Santoro
Duração: 91 minutos

Fonte: https://www.redebrasilatual.com.br/entretenimento/2012/04/quem-se-importa-mostra-pessoas-que-tentam-mudar-o-mundo

Alternativas: e se energia for um Bem Comum?



Eletricidade e combustíveis são vitais para atividade humana — mas produzi-los pode causar enormes impactos sociais e ambientais. Por isso, não podem continuar submetidos aos interesses do mercado.

Como estender os benefícios e conforto oferecidos pela eletricidade a todos os seres humanos — inclusive a um bilhão de pessoas que não têm, hoje, acesso a uma lâmpada elétrica? Como evitar que, a pretexto de garantir este direito, mega-empresas, quase sempre financiadas por recursos públicos, desenvolvem imensos projetos que afetam a natureza e as populações locais?

A Assembleia Europeia dos Comuns (AEC), uma articulação da sociedade civil impulsionada pela Fundação Peer to Peer (saiba mais aqui) propõe uma resposta inovadora. Ela quer alterar o paradigma que orienta, hoje, tanto a produção de eletricidade e combustíveis quanto sua distribuição e suas receitas. Ao invés de subordinarem-se a interesses de mercado, estas atividades devem ser consideradas Bens Comuns da Humanidade. As decisões essenciais precisam ser transferidas das mega-empresas a comunidades organizadas.

No vídeo acima, Cecile Blanchet, da AEC, explica as bases da ideia. Sob a lógica mercantil em que estamos mergulhados, ela argumenta, as decisões essenciais que determinam a vida coletiva são tomadas com base apenas em sua capacidade de gerar lucro. Constroem-se imensas usinas, redes de transmissão, gasodutos transcontinentais sem planejamento real. Muitas vezes, estes empreendimentos são duplicados ou triplicados — multiplicando os danos ambientais e sociais — porque o interesse de cada empresa é competir e desbancar as concorrentes.

Já há condições materiais, diz Cecile, de superar esta dinâmica predatória. As tecnologias da informação permitem às comunidades conhecer suas necessidades energéticas reais e planejar a produção, distribuição e — eventualmente — importação ou exportação de energia necessárias para satisfazê-las. Redes inteligentes permitem que cada domicílio não apenas consuma, mas também produza energia (a partir, por exemplo, de coletores solares ou pequenos cataventos).

É preciso derrubar as legislações que bloqueiam, na maioria dos países, esta geração decentralizada — para reforçar o poder do oligopólio. É preciso também que as agências estatais, hoje voltadas ao apoio a mega-empresas e projetos (vide, no Brasil, o papel do BNDES), financiem e viabilizem as iniciativas locais, muito mais modestas e racionais.

Será uma luta difícil e prolongada — tamanho o poder do oligopólio e a força de inércia do paradigma atual. Mas que transformação importante pode ser alcançada com facilidade, no cenário global áspero que vivemos? A potência da iniciativa da AEC está em ir além da crítica; formular uma alternativa; demonstrar que ela é concretamente possível — falta criar as condições políticas.

Fonte: http://outraspalavras.net/blog/2017/03/04/alternativas-e-se-energia-for-um-bem-comum/

Ouvir Bolsonaro?


Realizado o desejo de que uma chacina ocorra a cada semana, como um ex-secretário nacional da juventude confessou recentemente, então começaremos a respirar.

“Um animal não passa sem inquietação
ao lado de um animal morto de sua espécie”
(Rousseau, Discurso sobe a desigualdade, I)

Pode ter havido mais de uma razão para que outros não tenham feito o mesmo que Jean Willys, mas a verdade é que muitos inclusive que votaram pelo impeachment poderiam ter se juntado ao deputado do PSOL para mostrar seu repúdio àquele que, ao defender o ex-militar que homenageou o coronel Ustra, acenava com uma ordem que supostamente iria além do que admitiriam muitos do partido do “sim” à revogação do mandato presidencial. Deputados do PSDB, do PSB, mesmo do DEM e do PTB, além, naturalmente, dos partidos de esquerda, poderiam, todos, sem distinção, ter reagido, para além do “decoro”, cuja manutenção, nessa altura, apenas duplicava o horror – é verdade que a câmara televisiva, fixada no local da votação, não permitiu ver muito. Em todo caso, o exagero retórico aqui é necessário, pois o nome “Ustra”, pronunciado com devoção – como se devesse adquirir características táteis, tomar corpo e grudar em outros corpos, especialmente no corpo de Dilma – constituía mais propriamente uma fórmula invocatória de tudo que não deveria jamais ser trazido à lembrança, a não ser sob uma controlada e precisa ritualização, pois deve ser respeitado o temor de que certas palavras acordem os mortos. Por isso, deixar essa palavra soar livremente, como se tem feito, em debates promovidos por clubes, programas de auditório, talk-shows, como a imprensa norte-americana fez tanto com Trump, a quem, no entanto, repudia (mas não repudiava as cifras trazidas pelo seu ibope), ao longo de anos e muito antes de sua campanha eleitoral, permitindo que se tornasse familiar o mais sinistro, ouvir o que ele tem para falar, “por sórdido que seja”, como dizem alguns bem-pensantes, pois isso seria respeitar o “Estado Democrático de Direito”, reduzido por alguns a uma espécie de fórmula mágica, salva-vidas precário daqueles que já não sentem o tapete debaixo dos pés e veem se dissolver a própria identidade política – não é ouvir, na verdade, mas consentir que soe livremente o veredito arcaico de seu enunciado, ávido por destruição tanto como o gesto de “não devo nada a ninguém”, lido como ousadia por seus entusiastas – oh ele ousa dizer o que estava na ponta de nossa língua, mas não dissemos até agora porque somos covardes. Ele é que tem colhões! E assim, na vala da covardia, vão sendo jogados decoro, respeito, senso de limite, assim como a expressão formalizada de uma convicção íntima, a tal opinião. Na verdade, seria interessante imaginar o que seria a convicção do deputado se minimamente formalizada, assim como as convicções de tantos que se expressam selvagemente em portais e redes sociais. Por uma imposição interna da forma, esse conteúdo mortífero teria de perder um pouco de si. Creio que nem o partido nacional-socialista alemão ousava se expressar assim em suas campanhas iniciais e falar tão cruamente de seu projeto de morte: ao menos na fachada, prometiam vida, comunidade, espírito, e se expressavam de um modo que mal se distinguiu em princípio das propostas do partido comunista, de que tiravam impulso para sua posição, atraindo até mesmo um certo contingente de forças progressistas para a sua base, como a promessa aos trabalhadores de que se apossariam dos meios de produção – ainda que aos capitalistas dissesse o contrário: impedir a expropriação. De fato, a assombrosa pobreza de linguagem do ex-sargento de polícia deve muito ao empobrecimento geral do vocabulário da política, também à esquerda.

Na falta de requisitos como forma e senso de limite, não há a menor perspectiva de debate esclarecido. Pois se se tratasse de debate republicano, esfera pública democrática, instituições iluministas, “o que ele tem para falar” talvez nem chegasse à consciência e buscasse outras soluções, não racionais, como um sintoma, um tique nervoso, mas jamais a expressão articulada. “O que ele tem para falar” só teria lugar no divã de um analista ou em convescotes subterrâneos com seus camaradas, jamais na esfera pública que se quer democrática. O que chamam, mesmo os que o desprezam, “ouvir a opinião de Bolsonaro”, que em pesquisa recente atinge 20% de intenções de voto, é permitir que se escoe a água mole do elogio da tortura, do estupro e do extermínio, sobre cabeças não tão duras assim, é permitir a relativização de máximas universais e a consideração de mil casos particulares em que cabe o assassinato, avulso ou de massa: em vista do momento, de certos grupos, em vista disso, daquilo – no fim de tudo chamado, conforme a expressão local e grosseira de seu fascismo, de bandidos

Por que então não houve mais manifestações como as de Willys, que solitariamente reagiu ao que no entanto deveria ter feito tremer boa parte daquele coletivo? Cuspir não seria a única reação possível –o corpo poderia exprimir, espontaneamente, sua repulsa de várias formas: gritando, desmaiando, vomitando, abandonando a sala, se enrugando numa careta. Em suma, haveria muitas maneiras, e, claro, também cuspindo, não necessariamente no deputado – alguém já o fazia –, mas no chão. Por que não cuspiram todos no chão em sinal de repulsa e em defesa da humanidade? Sim, o corpo poderia exprimir, só ele, na sua inteligência própria, formada ao custo de inúmeras lutas e perigos, que antecedem a própria história humana. O corpo tem memória – sim, ele tem, ele deve ter! Em quantos braços ali a linha dos pelos se eriçou? Em quantos dos presentes o pulso cardíaco se acelerou? Se fossem gambás, teriam certamente desprendido um cheiro ruim, que isolasse o agressor. Como já disse, não é possível saber pelas imagens se soou um sinal de alerta mais geral na Câmara. Mas o fato é que se buscou mais tarde advertir e punir o único que reagiu, mediante a sentença, tão cara, mas tão cara, aliás, ao espírito do capitalismo de forma geral e, na versão última, neoliberal, reduzida à única máxima geral que entre os homens da cidade ainda faria sentido: isso não é profissional – não é assim que se age com colegas, isso fere o decoro parlamentar, eles estavam em ambiente de trabalho e outras patacoadas. Quando era de supor que a Câmara devesse pertencer a uma esfera mais alta e mais livre de negócios e interesses humanos que o mundo do trabalho… Buscou se salvar por uma particularíssima ética o que afrontava o âmbito mais amplo da moral e da dignidade humana. O “profissional” só pôde entrar no lugar do humano por uma dessensibilização pelo sofrimento para o qual qual acenava a palavra nefanda – nessa dessensibilização, ou descolamento do corpo vivo, toda razoabilidade é rematada burrice e tão cega como criaturas de um olho só.

A sensibilidade para as dores alheias o filósofo Schopenhauer chamaria de compaixão, a propensão em diminuir o sofrimento do outro, a qual, apesar de seu pessimismo, ele considerava universal. Mas a compaixão como ato moral puro se revelaria especialmente no momento em que um corpo, em movimento espontâneo, sai em auxílio de alguém que vê sofrer ou está em perigo. Trata-se de “uma participação imediata, sem nenhum pensamento de fundo, em princípio nas dores do outro e em seguida na supressão desse mal”, o que supõe por um momento “que seja destruída a diferença entre mim e o outro”. Mais inimigo da piedade era para ele não o egoísmo, que tinha por um afeto antimoral embora humano, mas o sadismo, que chamava de crueldade, o interesse e o prazer no sofrimento alheio e mesmo em sua produção – interesse que considerava “diabólico”, e não mais humano. Por isso, apesar de emprestar da moral cristã alguns termos, era uma oração de antigos hindus a que mais admirava: “Não sei de oração mais bela que aquela de que os antigos hindus se servem para fechar seus espetáculos (…). Eles dizem: ‘Possa tudo o que tem vida ser libertado do sofrimento!’. É inequívoca a base somática da virtude que elege como anterior à justiça, a qual é tanto mais verdadeira quanto mais provém daquela. Por razões semelhantes é que Eduardo Pavlovski, grande dramaturgo argentino, psicanalista de formação e nome de referência do psicodrama na América Latina, escreveu num de seus artigos na imprensa: “A cumplicidade civil é um conglomerado de corpos imóveis e aterrados. Quando falo de corpos me refiro a um regime de afecção, ao regime de conexão com outros corpos”. No centro de muitas de suas peças e reflexões está o problema, muito reichiano, aliás (sua fonte teórica mais citada a esse respeito, porém, é Deleuze), do fascismo como uma forma de relação com o mundo e com o homem, de uma atitude diante da vida, para ele plenamente endossada pelo neoliberalismo: é essa a atitude do médico de Potestad, que vistoriava, com frieza profissional e a serviço do governo ditatorial, o estado clínico de recém-torturados. Não se trata em princípio de um homem cruel, mas antes de um patético e atribulado pai de família. Um homem banal – “O mal é banal”, como se espantou Hannah Arendt na análise que fez de Eichman, que, submetido, durante o processo de seu julgamento em Jerusalém, a diversas perícias com equipes de psicólogos e psiquiatras, foi julgado “normal”. Seria preciso então, diz ela, questionar esse conceito de normalidade.

São normais afinal os que não acodem quando se grita socorro, não desmaiam, não se enrugam, não se contraem num espasmo, mas apenas assistem impassíveis, quando não filmam, o espetáculo do sofrimento do outro se desenrolando diante dos seus olhos e ao vivo, ou tranquilamente jogam futebol ao lado de um corpo desovado na praia durante a madrugada? A atonia somática, que parece aumentar à proporção do incremento de estímulos e choques da mais variada natureza, inclusive midiática, precisaria ser investigada, mas em conexão com a barbárie já própria a uma sociedade de origem escravista, que criou condições especialmente propícias para a formação de indivíduos sádicos, perfeitamente frios, ao menos quando se trata de certa “classe” de gente. Quantos olhos não se envisgaram e pararam, absortos no espetáculo oferecido diariamente pelos nossos pelourinhos? – mas a compaixão, diz Schopenhauer, não reconhece classe (nem mesmo espécie). Ela é uma capacidade natural de retratibilidade como uma acusação mimética da dor do outro, seguida de uma ação com vista a impedi-la, mesmo que se corram riscos. Mais enigmáticos ainda que os que, tomados de fúria irracional, lincham – são os que assistem ao linchamento.

Numa entrevista à TV Câmara do Rio, sob a complacente escuta do jornalista, que tinha começado a conversa com Bolsonaro avisando se tratar de um “querido amigo”, o ex-policial afirmava, depois de dizer que um colega parlamentar deveria ser submetido ao pau-de-arara: “Você sabe que defendo a tortura…”. O programa está tranquila e espantosamente disponível na internet, e não devem ter chovido críticas e mensagens furiosas – não devem ter se viralizado – o suficiente para fazer que seu diretor e a emissora o retirassem com um devido “mea culpa” e o próprio entrevistado voltasse a colocar o rabo entre as pernas, pois não seria tempo de fazê-lo passear à luz do dia. Mas este tempo, passado ou futuro, chegou, e multiplicam-se as hipóteses e versões para isso ter acontecido – o mais importante de tudo é que ele chegou, não percamos isto de vista em nenhum momento nem adiemos mais essa constatação. Aquilo que jamais deveria ter acontecido aconteceu. Quanto à emissão (de 2009), vê-la é penetrar numa zona que toda civilização que merecesse esse nome deveria tratar como santuário, acessível a poucos e apenas mediante certas provas –porque também o horrendo precisa de santuários: “Não vai falar de ditadura militar aqui. Só desapareceram 282. A maioria marginais, assaltantes de bancos, sequestradores. (…) E fazemos um trabalho que a ditadura ainda não fez: matamos uns 30.000, começando com o FHC (…). Se vão morrer alguns inocentes, tudo bem”. Talvez o mais grave de tudo seja: parte da multidão não se importa e outra parte está entusiasmada (“ele é muito querido”, como disse esta semana o diretor do Clube Hebraica do Rio de Janeiro). Enunciados de conteúdo tão grave podem ser proferidos antes mesmo que o candidato seja eleito, ou a “batalha” comece. O governo de Bolsonaro provavelmente seria muito mais… do mesmo. Como ele já avisou, terão mais pulso firme em fazer que só um lado da batalha vá para o cemitério, como se isso já não fosse o mais comum… “O que falta neste Brasil, Sr. Presidente? Falta um Presidente da República que assuma, que diga o seguinte: ‘Em combate, soldado meu vivo não senta em banco de réu’. E ponto final. Estamos em combate!”. A escala em que o horror ocorre ainda não é suficiente…

Mas deixemos o entrevistado de lado, e contemplemos mais, já que nos é tão facilmente acessível, aqueles que o olham e ouvem, impassíveis, ou quase. Essa complacência – ela talvez seja mais assombrosa. A partir de que momento ela começou a existir? A partir de que momento se começou a defender publicamente a tortura, prática no entanto jamais extinta entre nós, da senzala à periferia, presídios e morros, e irradiada para corpos de outras classes em períodos de exceção mais generalizada? A sua defesa pública e continuada, nem sempre seguida de tremores e contemporizada por muitos (oh, ele é polêmico, chega a ser engraçado!), me parece inédita no país e pertence, ao mesmo tempo, a um contexto mais amplo, em que a justificativa de sua prática começou há muito a tomar espaço. A propósito da invasão do plenário da Assembleia Nacional em novembro de 2016 por 40 pessoas exigindo a volta da ditadura militar, bem foi lembrado que não se tratava de mera opinião. É verdade, sob a capa de “opinião” e, eu acrescentaria também, liberdade de imprensa, o mais bárbaro vem à tona na dita esfera pública, se replica e viraliza, com risadinhas nervosas ou não, condescendentes ou não, de quem lhe deu toda a corda pra falar, com toda a “liberdade”. Com esta palavra, muitas vezes se amordaça aquele que diz “basta, não suporto mais, piedade, senhores, piedade! Meus ouvidos e meus olhos não suportam tanto estímulo letal! Vocês não têm o direito que imaginam ter, a liberdade de me matar um pouco a cada dia”. Dando costas quentes para o criminoso e o cúmplice na incitação ao crime, ela garante que circule a última mercadoria de um mercado exausto, que alimentou de todas as formas e imagens que pôde a fome de morte Escutar um louco com sede de tortura e acenando com um futuro em que poderia ser presidente – sentimos um frisson, a morte de raspão, talvez no vizinho – consegue ser ainda mais emocionante do que assistir ao elogio ou a franca incitação ao crime, à tortura e ao linchamento da parte de alguns jornalistas ou âncoras. Trafegando numa zona entre política, policial e midiática, ela constitui valor de uso para o telespectador, acrescido, assim, de mais-emoção – o enunciado de um provável presidenciável acalentando crimes contra a humanidade! Dêem-me o voto, e vocês verão. Por enquanto, nos excitamos, acumulamos sensações.

Uma brisa passa, o leite se enruga numa nata – muitos não se enrugam, não se retraem, não parecem afetados pela descarga de forças mortíferas a seu lado. Estamos diariamente submetidos ao nefando, olhando o que jamais deve ser olhado sem nenhuma proteção, como o rosto de Medusa, que nos deveria petrificar a um único acontecimento destes, e continuamos –mas só deus sabe de que forma é que estamos continuando. De que forma afinal estamos continuando? Isso só é possível com partes vitais queimadas.

Conforme um juízo que Bolsonaro exprimiu em 2014: “A única coisa boa do Maranhão é o presídio de Pedrinhas”. Não está em jogo apenas um pronunciamento “polêmico”, adjetivo, aliás, com que o ex-sargento é frequentemente apresentado em programas televisivos e radiofônicos, como se se tratasse de uma “diferença” a mais no mercado identitário: há os gays, os negros, as mulheres etc. e os excêntricos hostis a gays, mulheres e negros. De novo, chamá-lo de “polêmico” é nos deixar engambelar pelo uso inapropriado, embora provavelmente não ingênuo, de um vocabulário iluminista, pelo qual se trataria de apenas “uma opinião” entre outras, a ser ouvida, apesar de horrenda. Na verdade, não estamos apenas diante de um de juízo de gosto, opinião ou qualquer outro termo que se poderia retirar de um vocabulário tão decrépito como o do mundo que este secundava e estertora. No enunciado conforme o qual o melhor de um Estado – aliás, esse é dos mais pobres do país – é o lugar onde rolam cabeças dos que não tiveram lugar nele, há desejo e projeto, pois mal se oculta que o melhor que se poderia fazer ao Maranhão é transformar Pedrinhas em totem e princípio de organização de toda a sociedade, o que aliás já está em andamento. Mas o edifício de uma verdadeira nação precisará de muito mais pedrinhas… O melhor não é o que se pode apontar para a vida da sociedade, mas o que se pode propor de morte – assim como alguns pastores neopentecostais preferem falar mais em Satã que em Deus – , separando-se o vasto joio de um trigo cada vez mais restrito. Para o joio imprestável se retira a universalidade dos direitos, cuja lei que os determina já vai sendo modificada a toque de caixa e em muitas madrugadas de modo que esta não venha rigorosamente a prometer mais nada. O que está sendo pavimentado é o caminho para a política meramente como extermínio, pois, acredita-se, depois de todos os indesejáveis terem sido abolidos, depois de os violentos (e não importa se sob essa categoria se “subsumem” também inúmeros pobres ladrões de galinha) terem sido violentados até a morte pelas milícias e grupos informais semelhantes a Einsatzgruppen e tribunais de exceção e, claro, pela polícia, a vida então poderá começar. Para isso, deixe-se, aliás, que a polícia, ainda mais desumanizada pelas condições de trabalho e formação, aja a seu bel-prazer, sem precisar de ordens de cima, como em parte já ocorre, autônoma ou anárquica, “pró-ativa”, pois há muito trabalho pela frente. 

Realizado o desejo de que uma chacina como a de Amazonas ou Roraima ocorra a cada semana, como um ex-secretário nacional de juventude confessou recentemente, então começaremos a respirar.

Por Priscila Figueiredo

Ivine e o Travesseiro


Campanha mundial da Unicef "Unfairy Tales" ("Histórias Injustas", em tradução livre). A ação alerta sobre o drama das crianças refugiadas da guerra na Síria que arriscam suas vidas atravessando o Mar Mediterrâneo em botes precários para chegar à Europa. Lançado mundialmente esta semana, o filme de animação "Ivine and the Pillow" ("Ivine e o Travesseiro") mostra a trajetória da garota síria de 14 anos chamada Ivine e é narrado pela própria garota.

Malak e o Barco



A Unicef apresenta uma animação para chamar atenção às milhões de crianças refugiadas por causa da guerra civil na Síria.

O filme “Malak e o barco” de dois minutos, é narrado por uma menina de sete anos, que cruzou o Mar Mediterrâneo para fugir do conflito. Atingida pela água fria que invadia o barco, ela admite ter ficado apavorada com a possibilidade de ser afogada junto com a mãe. Nesse momento, as ondas tomam a forma de um polvo que ataca a embarcação, materializando o pesadelo diante de seus olhos.

A assinatura "Some stories were never meant for children" (“Algumas histórias nunca foram feitas para crianças”, em português) reforça o conceito de que ninguém deveria passar por essa situação.

Ao final, é revelada a criança que deu vida à animação. No site da Unicef, a organização traz a história completa da menina e sua família. Ela e a mãe se reencontraram com o pai e as irmãs na Grécia, mas seu irmão ficou na Alemanha. Como ela menciona na narração, tem saudades dos amigos.

O filme faz parte da série "Unfairy Tales", criada pela agência americana 180LA e produzida pela House of Colors, que traz animações sobre histórias reais de crianças sírias como Malak. A criação contou com criativos de diferentes países, entre eles, dez brasileiros: Eduardo Marques e Rafael Rizuto (da 180 LA) Adhemas Batista (da House of Colors); o roteirista e diretor André Holzmeister; Eliza Gatti, Ricardo Almeida e Guilherme Neder (da Today), Eduardo Luke e Luiz Abud (Hefty) e Rodrigo Augusto.

A Unicef lançará o segundo vídeo da série, "Ivine and Pillow", em março, além de outro conteúdo para a série para marcar os cinco anos do início do conflito na Síria.

Fonte: http://www.meioemensagem.com.br/home/comunicacao/2016/02/04/unicef-mostra-pesadelo-de-criancas-sirias.html

Na Suécia, igrejas pagam impostos


Grandes coisas fez o Senhor pelos pastores do Brasil no ano da graça de 2015, e por isso eles estão alegres.

Pois assim disse a eles a Nossa Senhora da Perpétua Isenção Fiscal: vinde a mim, e eu vos aliviarei. E no quinto mês, Eduardo Cunha das Mercês e sua falange evangélica afastaram de vez das igrejas o demônio dos impostos que agora só atormenta os ímpios, aleluia.  Desgraçados são os profanos suecos – ó homens de pouca fé! -,  porque deles o tinhoso continuará a cobrar o seu quinhão.

“É claro que pagamos impostos”, diz a pastora sueca Ulla Marie Gunner, com a naturalidade com que um Malafaia pede o cartão de crédito de um fiel.

“Jesus já disse: ‘dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus’”, recita instantaneamente a pastora na igreja evangélica Immanuelskyrkan (Igreja de Emanuel), no centro de Estocolmo.

Ainda que eu falasse a língua dos anjos, não conseguiria explicar a Ulla Marie como foi que Eduardo Cunha conseguiu abrir o mar regimental do Congresso para a travessia do seu “jabuti”: a emenda da isenção tributária às igrejas foi incluída – na surdina – na MP 668, que tratava originalmente do aumento de impostos sobre produtos importados.

O milagre do imposto zero foi testemunhado por multidões paralisadas em um transe coletivo, conto à pastora. Ao som das harpas dos querubins, os pastores se regozijaram com a caridade dos congressistas e do povo, sempre de joelhos. Com Deus e Cunha no comando, revelo à incrédula religiosa sueca, foi criado no Brasil o 11.o mandamento: “Nada se Pagará”.

É uma graça que não alcança os homens de boa fé da Suécia.

Como qualquer pastor sueco, Ulla Marie Gunner paga impostos sobre o salário e qualquer tipo de benefícios que recebe da igreja – incluindo casa, carro e eventuais ajudas de custo. E como toda igreja sueca, a Immanuelskyrkan é taxada pelo Leão por qualquer renda que não seja empregada para fins estritamente cristãos.

“E isso é o certo. A igreja deve ser parte da sociedade, e não uma entidade à parte, distanciada dos fiéis e da contribuição para o bem-estar coletivo”, diz a pastora.

Vou em busca de informações no Skatteverket, o Leão sueco, que afirma: só não há impostos sobre os imóveis ocupados pelos templos, e até o dinheiro das doações dos fiéis pode ser tributado – caso seja utilizado em benefício dos pastores, e não dos crentes.

“Se o pastor investir o dinheiro dos donativos em ações ou aplicações, terá que pagar impostos sobre os rendimentos, caso tais ganhos não sejam aplicados em atividades religiosas”, pontua Gunilla Landmark, analista fiscal do Skatteverket.

“Se o pastor ou a igreja comprarem uma fazenda, um hotel ou qualquer outro negócio com capital obtido através de doações de fiéis, também terão que pagar impostos. Se comprarem um imóvel ou um negócio no exterior, também pagarão impostos”, prossegue Gunilla.

O raciocínio sueco é o oposto do credo brasileiro: a Igreja, assim como também qualquer outra entidade sem fins lucrativos, paga impostos ao Estado.

“A premissa básica é a seguinte: todos, em uma sociedade, têm que pagar impostos e ser tratados de maneira igualitária. Tanto as igrejas, como os rebanhos”, resume a analista da autoridade fiscal sueca.

Não se pode controlar cada krona (coroa sueca, a moeda nacional), ela diz. Mas a autoridade fiscal detém, segundo Landmark, um eficiente sistema para verificar se as igrejas e os pastores estão fazendo o que devem.

“As igrejas devem comprovar que estão utilizando o dinheiro especificamente em obras de caridade e atividades afins”, diz Gunilla Landmark. “Se o dinheiro for empregado para fins religiosos, as igrejas podem ter certas deduções fiscais. Caso contrário, pagam impostos integrais”.

Na centenária Immanuelskyrkan, que congrega tradições batistas, calvinistas e metodistas, a pastora Ulla Marie confirma:
Se servirmos café aos fiéis, ou ganharmos dinheiro de qualquer outra forma, temos que pagar impostos.
Os tempos são outros: na Estocolmo dos anos 20, a hoje abastada Igreja de Emanuel era uma pobre congregação.

“Naquela época, muitos fiéis doavam porcos ou alimentos”, conta Ulla Marie. “Até a década de 60, nossa igreja vivia apenas dos donativos, e os pastores tinham que trabalhar o tempo todo para tentar obter doações dos fiéis”.

A partir dali, deu-se uma reviravolta – em vez de pedir dinheiro aos fiéis para suas atividades religiosas e de caridade, a Immanuelskyrkan resolveu entrar no mundo dos negócios.

“Várias congregações menores haviam se juntado a nós, ao longo dos anos, e todas tinham seus próprios bens. Aos poucos, fomos idealizando diferentes atividades, e hoje administramos um hotel, assim como diversos imóveis”, diz a pastora.

Estamos a poucos passos do hotel da congregação, o Birger Jarl. É um quatro estrelas, com mais de 270 quartos, no centro nobre de Estocolmo.

Para Ulla, gerir este e outros negócios é uma maneira bem mais eficiente de obter recursos, a fim de beneficiar as obras sociais da igreja:
Somos hoje uma igreja muito rica, até porque somos muito bons administradores. E pagamos impostos por isso.
A igreja de Ulla também possui asilos de idosos, assim como acomodações para estudantes. A Immanuelskyrkan recebe ainda contribuições da Prefeitura para gerenciar parte de suas obras sociais.

“Mas pagamos impostos por isso”, frisa a pastora. “Como pastores, temos ainda a possibilidade de viver em apartamentos de nossa igreja. Mas também somos taxados por isso.”

Vamos comparar: no Brasil, a fonte de renda das igrejas inclui, além do dinheiro recebido diretamente dos fiéis, a venda de bens e serviços e os rendimentos com ações e aplicações. É uma arrecadação bilionária, que apenas em 2011 representou R$ 20,6 bilhões. Só em benefícios fiscais, as organizações religiosas brasileiras recebem cerca de R$ 4 bilhões anualmente. Também não há tributação sobre ajudas de custo, como moradia e transporte para os pastores.

Com o “jabuti” de Cunha, os profissionais da fé ficaram livres da cobrança de impostos sobre as “comissões” que ganham por recolher mais fiéis, e mais dízimos. Muitos pastores recebem um salário baixo, que é tributável – o grosso vem por fora, com as “comissões” que, a título de ajuda de custo, chegam aos 100 mil reais. Sob as bênçãos do Congresso, as igrejas evangélicas poderão ainda conseguir a anulação de autuações fiscais que passam de 300 milhões de reais.

Na Suécia, só Jesus salva os pastores. Assim como no Brasil, qualquer pessoa pode abrir uma igreja aqui. Mas o primeiro ato obrigatório é registrar a congregação no Kammarkollegiet: trata-se da mais antiga autoridade pública do país, criada, nos idos de 1539, quanto o rei Gustav Vasa decidiu estabelecer uma agência dedicada a lidar com a coleta de impostos no reino.

“Uma vez registrada, a igreja recebe um código fiscal, que é repassado automaticamente a todas as autoridades fiscais”, diz Stefan Berg, um dos gerentes do Kammarkollegiet.

Pergunto à pastora Ulla Marie se ela considera os impostos excessivos, em se tratando de igrejas.

“A Igreja deve assumir suas responsabilidades na sociedade em que atua. Como cristãos, não podemos nos distanciar de nossas obrigações sociais e dizer, ‘não temos nada a ver com isso’”, acentua a pastora.

Poderá o Cristo Redentor, diante de tal revelação terrena, fechar os braços e bater palmas sobre a Guanabara.

Até lá, fica reproduzida abaixo uma mensagem natalina especial para os delegados da Receita Federal.

São falas cristãs extraídas de um vídeo que circula na internet, e que pode ser acessado aqui: https://www.facebook.com/emersonbhmg/videos/817050975081568/

Mensagem do Do Pastor Valdomiro – “O Trízimo”:
No mês de dezembro, você não vai devolver só o de Deus, os 10%. Você vai dar 20% do seu, você vai ser fiel. Você vai tirar 30%, e vai falar assim, ‘Senhor, representando a Santíssima Trindade – o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
Do Pastor RR Soares – “O Dízimo no Débito Automático”:
Eu estou pedindo às pessoas que têm conta, que façam a opção de em vez de ir ao banco depositar, para descontar direto da conta. É mais fácil, vai dar menos trabalho para você. Porque o diabo consegue às vezes fazer com que nós esqueçamos deste compromisso.
De Marco Feliciano – “Dízimo em cheque, cartão de crédito ou jóias”:
Seus filhos que acreditarem na oração deste profeta, e tiverem coragem de pegar dinheiro, cartão de crédito, jóias e ofertarem nesta noite (…) Ah, pastor, mas eu não sei o que fazer com o meu dinheiro! Esse problema não é seu. Esse problema é da igreja.
Do “Bispo” Edir Macedo, em reunião com seus pastores – “Como tomar dinheiro mais fácil”:
Você nunca pode ter vergonha, timidez. Peça! Peça! Quem quiser dá. E se alguém não der, tem um montão que vai dar. Tem que ser no peito e na raça. Bota pra quebrar.
Por Cláudia Wallin,
Fonte: http://www.claudiawallin.com.br/2016/01/02/na-suecia-igrejas-pagam-impostos/ 

O sistema de bem-estar social


Os anos dourados do Estado-providência sueco duraram até meados dos anos 70, quando a Suécia vivia a fama de ter criado a sociedade mais justa e igualitária do mundo. Turbulências e crises começariam porém a desequilibrar o vôo estável da economia sueca, produzindo cortes na radicalmente generosa política social. A crise do petróleo afetara profundamente a Suécia, que nos anos 90 enfrentaria ainda uma grave recessão provocada pelo estouro de uma bolha imobiliária impulsionada pelo setor bancário. No dilema da busca por um Estado de bem-estar social mais viável, já durante o governo social-democrata foram adotados ajustes e mudanças de curso, como redução de subsídios e privatizações parciais nos serviços públicos. Desde 2006, novas reformas no sistema vêm sendo promovidas pelo governo da aliança dos partidos de centro-direita.

Mas até o momento, apesar das imperfeições, o modelo social sueco ainda é um sistema robusto, em um país rico que continua a manter uma forte economia e uma indústria competitiva.

Quando uma criança nasce na Suécia, os pais têm direito a uma licença parental remunerada de 480 dias. Deste total, 60 dias devem ser usados exclusivamente pelo pai, e outros 60 dias exclusivamente pela mãe, o que significa que estes dias não podem ser transferidos para o outro progenitor. O valor da licença, nos primeiros 390 dias, corresponde a 80 por cento dos rendimentos da pessoa, dependendo de quanto a pessoa ganha. O teto máximo para o subsídio parental é de 874 coroas suecas (cerca de 140 dólares) por dia.  Para os demais 90 dias da licença, o valor do subsídio é de 180 coroas suecas (cerca de 27 dólares) ao dia. Os 480 dias da licença parental podem ser solicitados em prazos variáveis, até a criança completar oito anos de idade. O pai de um bebê recém-nascido pode tirar uma licença extra de dez dias, a partir do nascimento da criança. Se forem filhos gêmeos, o período da licença é dobrada: vinte dias.Pais adotivos têm os mesmos direitos à licença parental.

As creches pré-escolares são largamente subsidiadas pelo governo, e os pais pagam apenas oito por cento do custo mensal. Há também um teto máximo a ser pago por cada criança que frequenta a creche – para a primeira criança de um casal, este limite é de 1.260 coroas suecas (cerca de 190 dólares). O valor da taxa cai gradualmente até o quarto filho de um casal, que pode frequentar a creche gratuitamente. O salário médio de um sueco é de 35,8 mil coroas, segundo estatísticas de 2012. É também comum os pais se unirem em cooperativas para criar e gerir suas próprias creches, que são financiadas pelo governo no mesmo sistema.

A partir do momento em que nasce, cada criança recebe um subsídio mensal do governo no valor de 1.050 coroas suecas (aproximadamente 160 dólares), até completar 16 anos de idade. Quanto maior é o número de filhos do casal, maior torna-se o valor do benefício: o subsídio aumenta progressivamente a partir do nascimento do segundo filho, até atingir o máximo de 10.014 coroas mensais (cerca de 1,5 mil dólares) para uma família com seis filhos.

Após completar 16 anos de idade, cada criança passa a receber um subsídio mensal do governo no valor equivalente a 160 dólares mensais, como assistência financeira enquanto completa seu período de estudos. A contribuição é paga durante dez meses por ano, ou seja, não cobre o período das férias escolares.

O tratamento dentário é gratuito para crianças e adolescentes até os 18 anos de idade. Eles também podem ter aparelhos dentários financiados pelo governo regional: quando os especialistas julgam necessária a correção dos dentes, o paciente recebe um ”cheque saúde dos dentes” para custear os gastos com o ortodontista de sua escolha.

Quando as crianças têm problemas graves de visão, também é o governo regional que paga os óculos de grau. Para famílias com uma situação econômica extrema, os pais de crianças com deficiências de visão mais comuns podem contactar os serviços sociais, que então financiam os óculos.

O sistema de educação é financiado majoritariamente pela arrecadação de impostos, e a Suécia é um dos países que mais gasta neste setor. Não existem mensalidades escolares. A partir dos seis anos de idade, todas as crianças têm acesso gratuito à educação, que é obrigatória até o último ano do ensino médio. As escolas fornecem ainda todo o material escolar, incluindo livros, apostilas e cadernos. A merenda escolar também é gratuita, e consiste em geral de um bufê que inclui dois pratos quentes e uma opção vegetariana, além de saladas, legumes, pães e frutas. Após o horário escolar, creches e atividades supervisionadas são oferecidas nas escolas todas as tardes, para crianças entre seis e doze anos de idade. A partir das quatro da tarde, começa o entra-e-sai dos pais, que saem do trabalho diretamente para buscar os filhos na escola.

[Nota: na Suécia, 87 por cento dos adultos possuem o diploma do ensino médio, porcentagem maior do que a média de 74 por cento dos demais países da OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento). Fonte: OECD]

Se decidem cursar a universidade – que também é gratuita – os estudantes suecos têm direito a uma assistência financeira mensal, até completar os estudos. Esta assistência é composta por um subsídio de 3.066 coroas suecas (cerca de 463 dólares) por mês, além de um empréstimo no valor de 6.710 coroas suecas (cerca de mil dólares) mensais. Em caso de necessidade, o estudante pode se candidatar a um suplemento na ajuda financeira. O prazo para o reembolso do empréstimo é o dia em que o ex-estudante completa 60 anos de idade. Na minha época de estudante na Universidade de Estocolmo, eu recebia automaticamente um cheque mensal no valor do subsídio.

O sistema de saúde é também amplamente subsidiado, e a taxa de internação em um hospital é de 80 coroas suecas (cerca de 12 dólares) por dia. As taxas para atendimentos básicos variam entre 100 e 200 coroas suecas, dependendo da municipalidade. Para consultas a especialistas, a taxa máxima é de 300 coroas suecas (45 dólares). O sistema aplica ainda um limite máximo para as despesas de uma pessoa com saúde: a partir do momento em que um paciente desembolsa 900 coroas suecas no período de um ano, todas as consultas médicas tornam-se gratuitas por um prazo de 12 meses. Existe ainda um teto semelhante para as despesas com medicamentos – o que significa que ninguém gasta mais de 1,8 mil coroas com despesas de saúde no período de um ano (cerca de 270 dólares).

Em 2005, os conselhos municipais e o governo central decidiram introduzir uma garantia no atendimento à saúde. Isso significa que nenhum paciente deverá esperar mais de 90 dias, uma vez determinado o tipo de atendimento que ele necessita. Se o prazo estabelecido expirar, os pacientes têm a opção de receberem os cuidados necessários em outro local. O custo, incluindo as despesas com transporte, é pago pelo governo municipal.

O sistema de seguro social sueco também inclui subsídios de auxílio-doença. Durante os primeiros 14 dias de afastamento do funcionário, cabe aos empregadores pagar o benefício. Nos casos de enfermidades com tratamento mais longo, o sistema paga o auxílio-doença durante um período máximo de 364 dias, no valor de 80 por cento da renda do funcionário. Após este prazo, o paciente tem direito a receber o auxílio-doença por um período adicional de 550 dias, num valor correspondente a 75 por cento de seus rendimentos. O cálculo é feito com base em rendimentos anuais de no máximo 333,700 coroas suecas (cerca de 50 mil dólares). O benefício pode ser extendido em caso de doenças graves, e regras específicas regulam a concessão do auxílio-doença também a estudantes e desempregados. Pais de crianças doentes também têm direito a receber subsídios a fim de permanecer em casa para cuidar dos filhos.

Portadores de deficiência têm direito a assistência pessoal e gratuita, incluindo transporte em táxis ou veículos especialmente adaptados. Para os idosos, também é oferecida assistência social a domicílio – com taxas cobradas de acordo com a possibilidade de cada um de pagar. Para idosos com recursos limitados, o serviço pode ser gratuito. Todos têm a alternativa de escolher entre obter atendimento em casa até o fim da velhice, ou nas casas de repouso administradas pelos governos municipais.

O sistema de aposentadoria sueco é constituído por três partes – uma pensão nacional, uma pensão trabalhista que é financiada pelo empregador, e um plano de previdência privada. Um total de 18,5 por cento do salário e outros benefícios tributáveis do trabalhador são destinados à sua aposentadoria. pública. Deste total, 16 por cento vão para a conta de aposentadoria pública, cujo valor cresce de acordo com a evolução dos rendimentos e do desempenho da economia na Suécia. Os 2,5 por cento restantes vão para a chamada pensão premium, que varia segundo o desempenho dos fundos nos quais o trabalhador escolhe investir.

Para pessoas que tiveram pouco ou nenhum rendimento em suas vidas, há uma parcela menor da aposentadoria nacional, chamada de aposentadoria garantida. A finalidade é garantir a estas pessoas uma quantia mínima todo mês. O apoio de assistência aos idosos fornece uma última rede de segurança, para assegurar um padrão de vida digno.

Já o seguro-desemprego é voluntário – ou seja, o trabalhador deve se inscrever em instituições específicas para ter direito ao benefício, e pagar uma mensalidade. Estas instituições são conhecidas como ”A-Kassa” (Arbetslöshetskassor), e muitas são administradas por sindicatos. No pacote básico, a mensalidade é de 90 coroas suecas mensais (cerca de 13 dólares). Para poder usufruir de um salário-desemprego maior do que o básico, o trabalhador deve fazer um seguro suplementar, com contribuições mensais proporcionais ao salário. Quando perde o emprego, um trabalhador pode receber o salário-desemprego por até 300 dias úteis. Nos primeiros 200 dias, o benefício é equivalente a 80 por cento do valor do antigo salário – a um teto máximo, porém, de cerca de 100 dólares por dia. Nos demais 100 dias, esta porcentagem cai para 70 por cento. Os trabalhadores que perdem o emprego e não são afiliados à A-Kassa podem, ainda assim, obter benefícios – mas somente a um nível básico, e não superior a cerca de 48 dólares por dia útil.

Para famílias mais pobres ou com problemas econômicos temporários, os governos municipais prestam assistência sob a forma de apoio financeiro com base em avaliações individuais. Este apoio inclui recursos para despesas básicas, com a finalidade de garantir um padrão de vida razoável.

(fontes: Swedish Institute, Försäkringskassa (Agência Sueca para a Segurança Social), CSN (Agência Sueca de Assistência a Estudantes), Centro de Cuidados Dentários da Região Administrativa de Estocolmo e instituto sueco Global Utmaning).

É um sistema ainda amplamente generoso, que no entanto já foi melhor. Ao longo dos anos, o Estado de bem-estar social sueco sofreu uma série de reformas a fim de se adaptar às novas condições econômicas. Os subsídios ao desemprego foram contraídos, assim como o nível dos recursos para a saúde e a habitação. O sistema escolar sofre atualmente críticas pela queda no desempenho escolar dos estudantes, e pelo aumento do número de crianças em cada sala de aula. O modelo também enfrenta deficiências no número de profissionais capacitados para o atendimento aos idosos, e a imprensa sueca aponta para o fraco controle das autoridades públicas sobre a qualidade dos serviços prestados por algumas empresas privadas que, financiadas com o dinheiro dos impostos, atuam no setor. Várias escolas são hoje também administradas de forma independente, e a gestão privada do sistema de saúde é uma tendência que cresce.

Desde 2006, o governo de centro-direita busca implementar a sua visão para um modelo sueco renovado: deve ser mais atraente para os cidadãos suecos trabalhar, reza a mensagem, do que viver de subsídios sociais. A receita básica para incentivar as pessoas a trabalhar, na fórmula em curso, combina impostos mais baixos para os trabalhadores e menores benefícios sociais para quem está fora do mercado. Subsídios como auxílio-doença e pensões por invalidez se tornaram menos generosos, ao passo que os impostos sobre rendimentos têm sido reduzidos.

Para o governo de centro-direita, trata-se de modernizar o Estado-providência e dinamizar a economia sueca, sem alienar os tradicionais valores do modelo social sueco. Para a oposição de esquerda, trata-se de uma receita para a morte dos ideais de igualdade e solidariedade do país.

Cláudia Wallin
Fonte: http://www.claudiawallin.com.br/que-pais-e-este/#toggle-id-8