Confissões de um ex-pastor(IV)

Todas as vezes, nos últimos cinco ou seis anos, que eu tive a oportunidade de ministrar, seja palestrando, ensinando ou pregando, eu iniciei com as seguintes palavras: “Na presença do Cordeiro, o qual tem os olhos como que chama de fogo, se faz presente entre os candeeiros de ouro, tem na mão direita as sete estrelas, ama a verdade, abomina a mentira e julga com justiça”, esta introdução que repeti à exaustão eu a garimpei, como diria o Mestre Othon Guanaes Dourado, ilustre professor de Homilética do Seminário Presbiteriano do Norte em Recife, no site http://www.arpav.org/, provavelmente cunhada pelo Rev. Paulo Anglada, pastor presbiteriano de larga cultura, com descrições de Jesus segundo a ótica apocalíptica do prisioneiro de Patmos. Queria deixar isto registrado de antemão, não fui criador da mesma, apenas mero repetidor.

Mas ela retrata o medo e o temor que sou tomado quando estou à frente de um púlpito para pregar, falar de verdades eternas é uma responsabilidade muito grande, não se pode falar de céu e inferno sem tremer, então tenho que lembrar para mim mesmo na presença de quem estou, dá muito medo, dá vontade de sair correndo, muitas vezes já disse em oração para Deus, que se Ele tivesse alguém para pregar no meu lugar, eu de bom grado cederia o espaço, mas quando Ele me permite falar, e por Sua infinita graça usa meus lábios para edificar as almas, não existe sentimento mais sublime, já desci do púlpito quase que sem pisar no chão, tamanha a satisfação de ser usado por Deus, algumas vezes desci com uma vergonha tão grande que se pudesse me enterrava vivo.

Mas também sou acometido muitas vezes de orgulho, porque algumas vezes fui elogiado, ou muitas vezes fui criticado e me deixei abater, os dois sentimentos são doentios, preferiria não os tê-los, mas tenho que conviver com isto, tenho que tomar cuidado com a postura no púlpito, para não ser teatral, os gestos, a voz, cuidado para não ser superficial e falso, mas tudo é tão difícil.

Um dos mais belos sentimentos é poder falar de Deus, um privilégio, um dom, é algo inigualável, mesmo sabendo que não mais serei convidado a pregar, e mesmo que seja não devo mais aceitar, ainda assim eu ando pelas ruas, nos ônibus, montando sermões e me imaginando pregando, chego a chorar, me emociono muito. Tenho tantos sermões e ilustrações na cabeça que a única forma de me satisfazer é fingir que estou pregando, faço isso sozinho, trancado no banheiro, sei que sou indigno, gostaria de não ter mais a vontade de ser pastor, de ensinar, pregar, mas isso parece minha pele, gruda. Tenho medo que tal desejo seja fruto só da vontade de aparecer, querer destaque, notoriedade, mas creio que seja fruto de um resquício de vocação perdida e talentos ainda não enferrujados.

Não sou mais pastor por escolha minha, na verdade não sou por escolhas erradas que fiz, não sou por erros meus, mas bem que eu seria mais tranqüilo se não tivesse mais nenhum dom de ministério, eu seria mais feliz com minha perda de vocação se não tivesse mais nenhum desejo de pregar, ter o desejo e não poder exercê-lo é uma forma de punição, talvez a maior que alguém que se desqualificou para o ministério possa sofrer. Por isso só peço misericórida, só peço graça, só peço que: "... na Tua ira, lembra-Te da misericórdia..."

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