Oração de uma mãe judia


Abba hoje para algumas pessoas é dia das mães, eu queria poder dizer que estou feliz, eu queria poder dizer que este dia será muito bom para mim, mas não posso! O aperto que tenho no coração e o peso na alma não permitem que eu diga isso.

A razão para isso são os últimos acontecimentos relacionados com meu filho, meu coração está ferido e a minha alma parece caminhar por um vale de sombra de morte. Há noites que não durmo e os meus dias se resumem às lágrimas e cinzas, a esperança há muito que foi embora e o desespero me acompanha diuturnamente.

Como toda menina um dia eu sonhei em ser mãe, sonhei em ter filhos fortes, saudáveis e abençoados por ti, mas só mesmo quando eu soube que estava grávida foi que eu me dei conta do que seria ser mãe, só mesmo quando ele nasceu, cresceu, adoeceu, foi que eu entendi o que era ser mãe. Eu ia ao templo todas as vezes que podia, tal como Ana, eu não conseguia fazer com quê as lágrimas parassem de rolar pela minha face, eu não sabia se chorava ou se sorria, ser mãe me fez mudar a forma de me encarar e até mesmo de Te encarar, senti-me bem-aventurada, como nunca imaginara que um dia seria.

Ainda lembro da primeira vez que olhei para o meu filho, com os olhos inchados, tentando respirar, tentando entender o que estava acontecendo ao redor dele, só pude envolvê-lo nos meus braços e protegê-lo o máximo que eu pudesse, quase que não deixava que o tirassem de meus braços para purificá-lo como manda a Tua Lei. Qualquer choro ou gemido durante a noite eu me levantava para ver o que era, e só voltava a dormir depois que ele estivesse dormindo tranquilamente outra vez.

Quando pequeno demais eu não deixava que ele saísse da frente da nossa humilde casa, enquanto o pai dele trabalhava no fundo do quintal eu ficava cuidando dos afazeres domésticos, mas sempre atenta aos sons e ruídos que vinham de fora, ao menor de sinal de algo estranho, ou mesmo de silêncio, eu corria para a porta só me acalmava e retornava aos afazeres quando via que estava tudo bem.

Aos sábados, desde a mais tenra idade eu o via ir à Sinagoga com o pai, eu me sentia tão orgulhosa disso, ele voltava correndo para me recitar os textos que havia aprendido e as lições que lhe foram ensinadas naquele dia. Era muito inteligente e eu sempre soube que ele seria alguém muito mais importante do que eu e o pai dele.

Quando chegou o Bar Mitzváh, fizemos o que foi possível, dentro de nossas condições financeiras para que a data ficasse marcada na memória dele, depois da cerimônia na Sinagoga, no qual ele leu a Torah pela primeira vez, fizemos o "mazal-tov" no qual jogamos, seguidas vezes, aquela cadeira para o alto com ele sentado nela, cada vez que ele subia eu me pegava dizendo: “Fica no alto filho, é aí que eu quero que fique, o mais alto que puder!”.

Vezes sem conta eu me sentava debaixo de uma árvore, costurando alguma roupa rasgada, e fingia que estava entretida no trabalho, mas o que eu fazia mesmo era ficar olhando para a bancada no fundo do quintal, onde o pai dele, com tanto cuidado, ensinava-o os segredos da profissão, queria fazer dele o maior mestre na arte, e levava isso muito a sério, ensinou-lhe tudo o que pôde, o resto ele aprendeu por si mesmo, era inteligente demais e o único da família que sabia ler. Mas, mesmo ali eu sempre soube que ele não seria um mero artesão, ele tinha talento demais para ser apenas um simples trabalhador braçal.

Um dia, há três anos atrás, ele me disse que tinha que ir embora, que tinha uma missão para cumprir e que esta missão tinha sido dada por Ti, por isso, mesmo ficando triste, eu não me opus, sabia que se era a Tua vontade, ela teria que ser feita, eu não poderia, nem deveria, fazer nada contra isso.

Soube depois que ele e os seus amigos andavam pregando a liberdade, o amor, os mistérios do Teu Reino, como eles costumavam dizer, e curando os enfermos, expulsando demônios, com isso desafiando o poderio de Roma e criando inimizade com o poder religioso do Sinédrio, por mais medo que eu tivesse de que algo de ruim lhe acontecesse, ainda assim senti orgulho de saber que ele estava cumprindo a Tua vontade. Quando eu os via pregando, me enchia de orgulho e de satisfação, qual mãe não teria orgulho de um filho como o meu?

Soube no mês passado que três cruzes foram erigidas no Monte Gólgota e que alguns prisioneiros revolucionários, dentre eles um que pregava o amor e curava os doentes, seriam executados pelo romanos, já estava me preparando para ir para lá, tinha recolhido os poucos pertences de valor que eu tinha, para tentar comprar a liberdade dele, sempre ouvi falar que os romanos recebiam suborno.

Porém soube que o crucificado seria o Teu filho, não o meu filho, segundo me disseram o meu filho traiu o Teu com um beijo, beijo de amizade, beijo de traição. Eu não sei o que dizer, eu não sei nem o que pensar, me disseram também que meu filho ao se dar conta do que fez, e não vendo como corrigir o mal que causara, se enforcou, vou em busca do corpo dele, quero pelo menos dar-lhe um sepultamento. Não posso Te pedir perdão por ele, mas sei que como pai que és, compreenderás a minha dor de mãe e me darás a paz que eu tanto anseio.

Para muitos ele será Iscariotes, o Judas, para mim ele será sempre meu filho!

4 comentários:

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