Um toque de vulnerabilidade natalina

 
Talvez porque eu envelheci antes do tempo, eu ainda não fico muito à vontade com cartões eletrônicos, com mensagens coloridas e letras brilhantes. Mas essa forma de comunicação e expressão de bem querer chegou para ficar, e se não me rendo totalmente a ela, também não devo deixar de usá-la. Então aqui vai uma tímida expressão de um desejo de Feliz Natal. Feliz Natal? Que Natal? Eu fico um pouco desapontado quando percebo que Natal tem se tornado para muitos apenas um trampolim para a celebração da Festa do Ano Novo. A expectativa do Novo Ano parece ser tão grande que a celebração do Natal é facilmente obfuscada. Então Natal se tornou um trampolim, apenas enquanto uma espécie de festa preparatória para a festa maior que é a celebração de final de ano e acolhida da chegada de um novo ano que se inicia. O mais triste para mim é que o Natal não é nesse caso um trampolim impulsionador, mas um trampolim do tipo brinquedo menor no parque de diversões. Mas seria bom que o Natal fosse usado como um trampolim mesmo. Um trampolim impulsionador. Trampolim no qual as pessoas buscam o impulsionamento para serem atiradas de peito aberto para as novas aventuras de um Novo Ano.

Eu sou daqueles que curtem muito o período natalino. Gosto dos filmes, das músicas, das compras, das expressões nos rostos da pessoas. É claro que em meio a tudo isso sempre surge em mim aquele crítica antimercadológica e anticonsumista, mas eu curto tudo isso assim mesmo! Há uma certa magia no ar. Existe um certo encantamento, que eu gosto de curtir. E eu me sinto com um menino novamente. O período natalino mesmo quando destituído do seu significado mais profundo pode proporcionar isso. Adultos voltando a ser crianças! E penso que é disso que precisamos: Deixar de posar de adultos, se desvencilhar da couraça protetora mas que sufoca a expressão do amor, desfazer esse semblante sério e responsável e se soltar como uma criança diante da beleza do mundo. Não era isso que Aristóteles e Platão diziam em relação a filosofia? A filosofia começa com uma atitude de maravilhamento diante do mundo. E parece que para sermos vistos como adultos nós somos forcados a perder essa capacidade de maravilhamento. As vezes esse maravilhamento nos leva à aquele famoso embobecimento, expressa na famosa frase do sábio fulano de tal: “O Amor é lindo e embobece.” Pois Natal é’isso, Deus se fazendo criança, Deus se embobecendo para experimentar todo esse maravilhamento que nós humanos somos convidado a vivenciar!

Eu acordei hoje tentando encontrar uma frase que resumisse um pouco o significado mais profundo do Natal, e cheguei a uma conclusão que penso definir uma dimensão importante da mensagem natalina:

Natal é Deus tornando-se vulnerável aos deleites e às agruras do amor.

Então Natal é Deus se entregando como um presente, e nessa entrega ele se faz vulnerável. Ele sofre o risco da agrura da rejeição e indiferenca, mas também se abre para experimentar o deleite da aceitação e reciprocidade. Natal é Deus presente e Natal é presente de Deus! Emanuel, o Deus conosco, mas o Deus que se dá a nós como uma dádiva infinita. Então Natal é entrega! A palavra grega usada no Novo Testamento para descrever essa entrega divina é Kenosis, que significa esvaziamento e mesmo rebaixamento (Filipenses 2.6). No Natal Deus se esvazia do seu próprio poder para viver dentro das limitações humanas. Deus se rebaixa para exaltar os seres humanos. Deus se biologiza para tirar os humanos do estado meramente animal e trazê-los de volta a transcendência. Deus se faz carne demonstrando que não há nada errado com o corpo humano e a fisicalidade. Mas Deus também se corporifica numa afirmação inequívoca de que não existe espiritualidade vivida fora do corpo e separada dos outros. Deus toca o mundo e se permite ser tocado por ele.

Que este Natal seja o trampolim que nos impulsione a viver um Ano Novo de forma mais plena e profunda. Que façamos como Deus e nos entreguemos kenoticamente ao outro! Que sejamos esvaziados do egocentrismo e nos enchemos do amor que se entrega, que se faz vulnerável. Que toquemos o mundo! Que nos permitamos ser também tocados por ele!

Feliz Natal!

Nele,

The Revd Joabe G. Cavalcanti
St Barnabas Vicarage

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