A existência de um simples e único Estado necessariamente pressupõe a existência, e se necessário provoca a formação de diversos Estados, sendo natural que os indivíduos que se acham fora deste Estado e que são ameaçados por ele na sua existência e liberdade, deveriam virar-se contra ele. Aqui temos a humanidade partida em diversos Estados que são estranhos, hostis e ameaçadores entre si.
Não há direito comum, e nenhum contrato social entre eles, porque se um contrato e direito destes existissem, os vários Estados não mais seriam absolutamente independente um do outro, tornando-se membros federados de um grande Estado. A não ser que este grande Estado abrangesse toda a humanidade, seria necessário ter contra ele a hostilidade de outros grandes Estados, federados internamente. Desta forma, a guerra seria sempre a lei suprema e necessidade inerente da existência humana.
Todo Estado, seja ele de um caráter federativo ou não-federativo, deve procurar, sob a pena de absoluta destruição, tornar-se o mais poderoso dos Estados. Ele deve devorar os outros para que não seja devorado, conquistar para que não seja conquistado, escravizar para que não seja escravizado — porque duas forças similares e ao mesmo tempo alheias, não podem co-existir sem destruir uma à outra.
O Estado então é a mais escandalosa negativa, a mais cínica e completa negativa da humanidade. Ele estraçalha a solidariedade universal de todos os homens sobre a Terra, e une alguns deles somente para destruir, conquistar e escravizar todos os restantes. Ele tem sob sua proteção somente os seus próprios cidadãos, e reconhece direitos humanos, bondade e civilidade apenas dentro das dimensões de suas próprias fronteiras. E como ele não reconhece nenhum direito fora de seus domínios, ele atribui a si mesmo o direito de tratar com a mais feroz desumanidade todas as populações estrangeiras, que ele pode roubar, exterminar, ou subordinar de acordo com sua vontade. Se ele demonstra generosidade ou bondade para eles, ele não o faz por nenhum sentimento de dever fazê-lo: e isto porque não há dever senão para com ele, e para aqueles que o formam, através de um acordo mútuo e livre.
Como não há legislação internacional, e como isto não pode nunca existir de uma maneira séria e real sem demolir-se os reais bases e princípios da soberania dum Estado absoluto, o Estado não pode ter nenhum dever para com populações estrangeiras. Se então ele trata humanamente um povo conquistado, se não extermina e pilha completamente este, e não o reduz ao mais completo estado de escravidão, ele age desta maneira talvez por considerações de conveniência e prudência política, ou ainda talvez por pura generosidade, mas nunca por obrigação - porque ele tem um direito absoluto de dispor deles da maneira que quiser.
Esta flagrante negação de humanidade, que constitui a real essência do Estado, é do ponto de vista do segundo a suprema obrigação e a maior virtude: é chamado patriotismo e constitui a moralidade transcendente do Estado. Nós o chamamos de moralidade transcendente porque normalmente ele transende o nível de moralidade humana e justiça, seja privada ou pública, e por isso ele freqüentemente coloca-se em contradição. Então, por exemplo, para ofender, oprimir, roubar, saquear, matar, ou escravizar um companheiro, é para a moralidade comum dos homens, cometer um grande crime.
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Primeira Edição:
Fonte: http://www.crisluc.arq.br/
Tradução: Zilá Bernd
HTML: Fernando A. S. Araújo.
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HTML: Fernando A. S. Araújo.
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